Uso de maconha está mesmo liberado no Brasil? 

Advogado arcoense responde às perguntas polêmicas sobre o tema


O Supremo Tribunal Federal (STF) finalizou, no dia 26 de junho, o julgamento do Recurso Extraordinário que descriminalizou o porte de maconha para uso pessoal e fixou a quantia de 40 gramas para diferenciar usuários de traficantes.

Com a decisão, não comete infração penal quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo até 40 gramas de maconha para consumo pessoal.

Para esclarecer as dúvidas sobre o tema, geralmente evidenciadas em redes socais, o Portal CCO recorreu ao advogado criminalista Cayo Freitas.

Ao perguntarmos sobre os fatores positivos e negativos, assim como possíveis consequências dessa decisão, ele responde que a questão do uso de drogas “nunca deveria ser encarada como um problema de segurança pública e repressão policial, e sim como um problema de saúde pública”.

Dr. Cayo acredita que “o problema com o uso indiscriminado de drogas lícitas ou ilícitas continuará a existir e assolar inúmeras famílias, enquanto não houver sérios investimentos em políticas públicas de conscientização sobre o uso das drogas e suas consequências, bem como no acolhimento do adicto e seu efetivo tratamento”.

A medida não estaria beneficiando quem vende?

Para responder, Dr. Cayo citou o Relatório Mundial sobre Drogas 2022, elaborado pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC). De acordo com o documento, “a legalização da cannabis em algumas partes do mundo tende a indicar um aumento do uso e dos impactos relacionados à saúde”.

Ele argumenta: “Contudo, essa não é a realidade brasileira, afinal, a decisão do STF não legalizou o uso de cannabis, apenas descriminalizou a conduta em situações específicas. A conduta continua sendo um ilícito administrativo, ou seja, se a pessoa for flagrada com até 40 gramas de cannabis ou até seis plantas fêmeas, terá a droga apreendida e responderá a um procedimento não-penal onde poderá receber as sanções do art. 28 [da Lei 11.343/2006].

No referido artigo, da Lei de 2006, consta que as penas para aquele que comete o crime de uso de substâncias entorpecentes são: I - advertência sobre os efeitos das drogas; II - prestação de serviços à comunidade; III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.

De acordo com publicação da Agência Brasil de Notícias, feita dia 27 de junho, deixa de valer a possibilidade de cumprimento de prestação de serviços comunitários. Segundo Dr. Cayo, “isso se aplica apenas ao caso de pessoa com 40g de maconha ou 06 plantas fêmeas para uso pessoal”. “A pessoa flagrada em uso de drogas, fora dessa situação, continua podendo ter as penas do art. 28 imputadas em seu desfavor”.

40 gramas não é muito? Qual era a quantidade limite até então, para diferenciar usuário de traficante?

Segundo Dr. Cayo Freitas, a Lei 11.343 nunca definiu   uma quantidade específica para diferenciar usuário de traficante.

“Os parâmetros, de ordem subjetiva, dizem respeito à natureza e quantidade da droga, o local onde a ação se desenvolvia, as circunstâncias sociais e pessoais, bem como a conduta e os antecedentes da pessoa. Com critérios tão amplos, situações onde se tem o crime de uso de drogas acabam sendo interpretadas como tráfico de drogas, oportunidade em que a pessoa acaba sendo punida com uma pena de reclusão que varia de 5 a 15 anos, gerando enormes injustiças”, diz.

Onde comprar? Serão permitidos comércios legalizados? Ou os usuários continuarão comprando dos traficantes?

“Como dito anteriormente, o fato de o STF ter descriminalizado a conduta, em circunstâncias específicas, não significa que o uso de maconha está autorizado no Brasil. Assim sendo, não haverá comércios legalizados ou qualquer outro estabelecimento autorizado a realizar a comercialização da substância. Se, eventualmente, algum comércio ou pessoa se colocar na condição de comerciante de maconha ou qualquer outra substância entorpecente ilícita, fatalmente responderá pelo crime de tráfico de drogas”.

Um usuário flagrado com 40 gramas, embora ele não seja preso, estará cometendo um ato ilegal. E quanto ao fornecedor dele? Mesmo que tenha um estoque em casa (superior a 40 gramas), para venda, não estará cometendo crime ao vender até 40 gramas para cada cliente?

Dr. Cayo Freitas esclarece: “O STF determinou que a pessoa que adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, até 40g de cannabis ou 06 plantas fêmeas, não estará cometendo crime algum, e sim um ilícito administrativo. A pessoa que comercializar essa substância responderá pelo crime de tráfico de drogas”.

Alerta: mesmo com quantidades inferiores ao estabelecido, a pessoa pode ser presa em flagrante delito em certas circunstâncias

O advogado salienta que a presunção de que se considera usuário aquele que adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, até 40g de cannabis ou 06 plantas fêmeas, é relativa. “Isso significa que, mesmo com quantidades inferiores ao estabelecido, a pessoa pode ser presa em flagrante delito se estiverem presentes indícios que indiquem a mercancia da substância, como, por exemplo, a forma que a droga se encontra acondicionada, a variedade de substâncias apreendidas, apreensão de instrumentos como balança de precisão, registros de operações comerciais, aparelho celular com contatos de usuários e/ou traficantes, dentre outros”.

Continua proibido fumar a droga em local público

A partir deste trecho da matéria, as informações são da Agência Brasil de Notícias (matéria postada em 27 de junho, com edição de Graça Adjuto). https://agenciabrasil.ebc.com.br/justica/noticia/2024-06/entenda-decisao-do-stf-sobre-descriminalizacao-do-porte-de-maconha
De acordo com o texto, permanece proibido fumar a droga em local público.

O julgamento foi da constitucionalidade do Artigo 28 da Lei de Drogas (Lei 11.343, de 2006). Para diferenciar usuários e traficantes, a norma de 2006 prevê penas alternativas de prestação de serviços à comunidade, advertência sobre os efeitos das drogas e comparecimento obrigatório a curso educativo. A lei [de 2006] deixou de prever a pena de prisão [para usuários], mas manteve a criminalização. Dessa forma, antes da decisão da Corte, usuários de drogas eram alvos de inquérito policial e processos judiciais que buscavam a condenação para o cumprimento dessas penas alternativas.

A Lei de Drogas continua valendo, mas a Corte entendeu que as consequências são administrativas, deixando de valer a possibilidade de cumprimento de prestação de serviços comunitários. Estão mantidas apenas a advertência e presença obrigatória em curso educativo, que deverão ser aplicadas pela Justiça em procedimentos administrativos, sem repercussão penal.

O registro de antecedentes criminais também não poderá ser avaliado contra os usuários.

A Ata do Julgamento foi publicada pelo STF no dia 28 de junho, conforme consta em divulgação da Agência Brasil. Com a publicação, deve começar a ser cumprida a decisão.

https://agenciabrasil.ebc.com.br/politica/noticia/2024-06/decisao-sobre-descriminalizacao-do-porte-de-maconha-deve-ser-cumprida