Aumento de temperaturas e degelo no Ártico podem inviabilizar vida em diversas partes do mundo, diz o jornalista Ernesto Paglia

Aumento de temperaturas e degelo no Ártico podem inviabilizar vida em diversas partes do mundo, diz o jornalista Ernesto Paglia

"A geleira da Groenlândia está derretendo e esse processo é irreversível. Se o aumento de temperatura continuar como está, a estimativa, conforme os pesquisadores, é que, em 2040, não haverá mais gelo no verão no Ártico". As afirmações foram feitas pelo jornalista Ernesto Paglia durante a apresentação Os alertas do clima, na primeira edição de 2024 do Segunda 18 horas, evento promovido pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), por meio do Centro de Estudos e Aperfeiçoamento Funcional (Ceaf), na segunda-feira, 26 de fevereiro, em Belo Horizonte.

A Groenlândia, considerada a maior ilha do mundo, fica entre o Atlântico Norte e o mar do Ártico. "O que acontece lá agora repercute aqui depois. O Ártico é como uma trincheira avançada da mudança climática global e já sofre com uma elevação de 4 a 5 graus na temperatura, o que é previsto para ocorrer no resto do planeta até o fim deste século", esclareceu Paglia. Ele explicou que, de acordo com especialistas, a temperatura do Ártico aumenta três vezes mais rápido do que nas outras partes do mundo. "Esse calor pode inviabilizar a vida em diversas partes do mundo", revelou.

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Durante sua apresentação, o jornalista - que já visitou mais de 50 países para produzir reportagens e documentários jornalísticos - contou as experiências de quando esteve no extremo norte Groelândia três vezes, sempre a trabalho, ao longo de 28 anos - em 1995, 2007 e 2023. Com o cinegrafista Marco Antônio Gonçalves, ele visitou Qaanaaq, aldeia onde vivem os indígenas inuits - povo nativo do Ártico, também chamados de esquimós, apelido pejorativo (que quer dizer "comedores de carne crua") dado por habitantes que vivem mais ao sul.

Na primeira expedição, em 1995, para acompanhar o trabalho dos caçadores dessa aldeia, ele e o cinegrafista percorreram 400 quilômetros em um trenó puxado por cães em cima de uma plataforma de gelo de dois metros de espessura. Foram 11 dias de viagem e acampamento.

Na segunda expedição, em 2007, tentaram repetir a aventura, mas a viagem era muito arriscada, por causa da espessura do gelo já muito fina. "Na quarta noite no acampamento, fomos acordados pela intérprete que gritava para irmos embora logo, porque o vento estava soprando forte e o gelo sobre o qual estávamos acampados poderia rachar. Tivemos que pegar nossas coisas e equipamentos que estavam espalhados e sair dali correndo até um refúgio".

Em 2023, aconteceu a mesma coisa, mas desta vez foi antes, no segundo dia. E, novamente, precisaram se recolher em um refúgio. O jornalista comentou que o perigo se deve pelas tempestades cada vez mais frequentes que racham as placas de gelo que estão mais finas por estarem derretendo. Como consequência, os caçadores não caçam mais como antigamente. A pequena aldeia de 600 habitantes necessita recorrer ao supermercado, que é abastecido uma vez ao ano basicamente de produtos ultraprocessados.

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"A enfermeira do hospital local nos contou que há 30 anos não havia ali casos de diabetes ou hipertensão. E atualmente, ela afirma que metade da população é hipertensa e 22 pessoas são diabéticas", ressaltou.

O degelo no Ártico provoca o aumento do volume dos oceanos com consequências para o resto do mundo. O jornalista citou o exemplo da cidade de Olinda, no Pernambuco, que enfrenta erosão em alguns locais por causa do avanço do mar. Ele mencionou ainda que trechos da BR-101, também no Nordeste do Brasil, precisaram ser transferidas para locais mais distantes da praia, porque a água já estava invadindo. "Quando lembramos que 80% da população mundial vive à beira-mar ou próxima a grandes massas de água, percebemos que o ocorre na Groenlândia tem potencial devastador", destacou, esclarecendo que cientistas desconhecem formas reverter o processo do degelo, porém existem maneiras de diminuir o ritmo com que isso está ocorrendo.

Paglia finalizou sua apresentação convidando os presentes a consumirem de forma mais consciente, alterando hábitos, abrindo mão de algumas coisas e fazendo reflexões sobre os nossos comportamentos na hora de consumir. "Isso é ética intergeracional", concluiu.

Segunda 18 horas

O projeto Segunda 18 horas tem como objetivo trazer, periodicamente, ao MPMG, grandes nomes de relevância contemporânea para discutir temas da atualidade, nas mais variadas frentes do conhecimento, como as áreas jurídica, filosófica, social ou histórica.

Na abertura do evento, a diretora do Ceaf, procuradora de Justiça Élida de Freitas Rezende, ressaltou que esta primeira edição de 2024 tem o apoio do Centro de Apoio Operacional às Promotorias de Justiça de Defesa do Meio Ambiente (Caoma). O coordenador do Caoma, promotor de Justiça Carlos Eduardo Ferreira Pinto, apresentou o jornalista Ernesto Paglia e fez a mediação do evento.

*As três viagens de Ernesto Paglia à Groenlândia deram origem ao documentário 3x Ártico: os alertas do gelo, disponível na plataforma de streaming Globoplay.

Fotos: Camila Inácio Soares/MPMG

Fonte: Ministério Publico MG