Recuperando da APAC em Arcos concluiu MBA na USP

Conheça a história de Alexandre Pereira

Recuperando da APAC em Arcos concluiu MBA na USP
Alexandre segura o troféu que recebeu da Escola Superior de Agricultura

Ele foi preso em setembro de 2015, quando já era graduado em Direito pela PUC Minas em Arcos, com registro na OAB (Ordem dos Advogados do Brasil). Tinha formação técnica em três áreas: Mecânica, Mineração e Edificações. Realizava projetos nas áreas de mecânica e edificações. Também era comerciante. 

Para evitar a exposição negativa e considerando que o foco desta matéria é a oportunidade de estudo dentro da APAC, optamos por não informar o crime cometido por Alexandre Pereira. Inicialmente, a pena que ele deveria cumprir foi fixada em 44 anos. Depois passou para 24 e, na sequência, para 19. A partir de junho de 2022, seu regime foi alterado para o semiaberto. Ele também tem direito a saídas temporárias.  

É um dos recuperando da Associação de Proteção e Assistência aos Condenados (APAC), em Arcos, há cinco anos.

Na manhã de ontem (24 de abril de 2023), o CCO esteve na unidade e conversou com ele.  Alexandre, que está com 48 anos, nos contou como conseguiu o título de pós-graduação. Ele pediu ao inspetor de segurança da época que o ajudasse a seguir com os estudos. Foi quando o inspetor verificou a disponibilidade das bolsas de MBA da USP (Universidade de São Paulo) e providenciou a inscrição do recuperando, que optou pela área de Gestão de Pessoas. 

“Ele fez minha inscrição e eu consegui entrar. Na época, eles pediram pra eu escrever uma carta, contando minha história, como me formei e como vim parar na prisão. Contei tudo para eles”. 

Iniciou o curso (on-line) em abril de 2021 e terminou em dezembro de 2022. Todo o material de estudo foi disponibilizado na plataforma. Estudou de segunda a sexta-feira, de 7 às 10 horas, ao longo de um ano e oito meses.

A nota obtida no trabalho final foi 8,5. “Era para eu ter tirado 10, só que, no dia da apresentação, o computador travou e eles começaram a ligar aqui dizendo que estava na hora da apresentação. Então, [...] com muito custo, conseguiram arrumar o computador para eu apresentar”. 

O atraso lhe custou a perda de um ponto e meio. “Deu um atraso de cinco minutos e as professoras disseram que eu iria perder um ponto e meio somente porque eu não entrei no horário, mas disseram que, do contrário, era pra eu ter tirado 10, porque meu trabalho foi um dos melhores”.

A pesquisa

Ao aprender os métodos de gestão de pessoas em seu curso na USP, ele fez uma pesquisa bibliográfica sobre todos os temas da APAC e abordou especificamente sobre “Gestão de pessoas e a difícil ressocialização da pessoa presa”. Constatou que o método APAC usa a gestão de pessoas. No entanto, percebeu que nos manuais da Associação não há comentários de que se trata de “gestão de pessoas”. “Aí, eu demonstrei que eles poderiam usar os termos de gestão de pessoas, porque, na prática, é”. 

Nosso entrevistado exemplificou informando que a APAC recorre à psicologia e a outras ferramentas de gestão para contratar funcionários. Nesse aspecto, ele observou, ao pesquisar sobre outras unidades da associação, que aquelas que não utilizam essas ferramentas acabam contratando funcionários às pressas. Com isso, as consequências não são positivas. “Tem muitas APACs que, na pressa de contratar funcionários, pegam o primeiro que chega e fazem a inscrição dele. Pegam para suprir aquela vaga e acabam fazendo bobagem; acabam atrapalhando, talvez, no desenvolvimento dos recuperados”, explicou. 

O estudante/recuperando apontou, em seu trabalho, essas falhas sobre a instituição. Além de ser encaminhado à USP, o material foi enviado à Fraternidade Brasileira de Assistência aos Condenados (FBAC), que é uma associação que assessora as APACs. A própria FBAC fez a solicitação.   

Três propostas de emprego

Alexandre trabalha na fábrica de blocos da APAC, mas disse que tem proposta de trabalho de três empresas, na área de projetos – na qual ele já trabalhou antes da prisão. “As propostas de emprego são de empresas de Arcos e região. Graças a Deus, eu sempre tive bons contatos nas empresas e sempre me procuraram”.

Atualmente, ele está solicitando à Justiça o regime domiciliar, para ter condições de trabalhar fora da APAC e dormir em casa. Também irá solicitar uma revisão no processo. 

Para otimizar o tempo, tenta conseguir bolsa de estudo para outro curso.

“Evitem as companhias erradas e escutem as mães!”

Alexandre não nega suas fraquezas e também não nega que tenha cometido um crime, mas afirma que se arrependeu. 

Inicialmente, ele disse que se arrepende das “amizades” que o colocaram na prisão. Mais adiante, perguntamos:

Qual foi sua maior fraqueza na vida?

Ele logo respondeu: “O que me trouxe para a prisão; eu me arrependo demais”.

Alexandre também acredita que continua preso por falta de condições de pagar um bom advogado. Nesse sentido, ele aconselha a todos: “Evitem as companhias erradas. Infelizmente, a corda só vai arrebentar do lado mais fraco; e escutem as mães. Minha mãe me falou uma vez, sobre pessoas que viu em minha loja. Ela disse: ‘Não agradei dessas pessoas’. E deu no que deu! Coração de mãe sabe!”

Ele recebia visitas da mãe e do irmão, mas os dois faleceram. “Agora estou somente com Deus”, falou.

O que mudou em sua vida interior, depois da prisão?

 “Me tornei mais humano, vi que a gente, na vida, não vale nada. A gente precisa tanto das pessoas; e depois que você cai na prisão é que você vê que nem seus amigos, que eram de dentro da sua casa, te mandam uma carta para perguntar se você está bem. É só a mãe e o pai que lembram da gente”. 

O pai dele faleceu em 2014 e a mãe, em janeiro deste ano. 

Alexandre carrega um terço no pescoço. Ele disse que participar dos cultos e das missas tem sido importante em sua recuperação. “Sou ecumênico. Se tem culto aqui, vou ao culto; e se tem missa, vou à missa. A cada dia que acordo, tenho Deus na vida. Como está na Bíblia: ‘Em tudo, dê graças a Deus’. Estou preso, mas eu poderia estar numa cama, poderia estar pior. Tem gente pior. Tive meu pai que sofreu com câncer, meu irmão... Deus está me dando força, Deus é bom demais!”. 

O método APAC

Sobre o método de recuperação da APAC, ele disse que proporciona tratamento digno. “O ser humano erra, mas por isso ele não precisa ser tratado igual cachorro... igual um animal [...]. Aqui, desde o dia que cheguei, sempre me trataram super bem, como se fosse da família mesmo”.

Ele continua o relato dizendo que não é um “hotel de bandido”, como algumas pessoas falam. “Levantamos 6 horas e trabalhamos até as 10 horas.  É duro, mas é como se fosse na casa da gente mesmo... e família também tem suas brigas. Com o tratamento que temos aqui, se a pessoa não recuperar é porque não quer mesmo”.

Planos

Com a revisão do processo, Alexandre tem a esperança de sair da APAC daqui quatro anos e reconstruir sua vida. “Perdi tudo que eu tinha, que era o meu carro e minha loja”, contou, acrescentando que irá continuar a vida de trabalho que levava antes da prisão e recuperar o que perdeu. Também disse, orgulhoso, que é pai de uma jovem que já concluiu curso superior.