AS VOZES DAS MULHERES EM O ANO DAS BRUXAS

Confira mais este artigo de Francielle Ferreira, em sua coluna Mística Literária

AS VOZES DAS MULHERES EM O ANO DAS BRUXAS

O ANO DAS BRUXAS é um livro mágico da escritora estadunidense Alexis Henderson, cuja publicação ocorreu em 2020 e a tradução em 2021 pela editora DarkSide Books.

 Trata sobre uma época em que uma cidade fictícia chamada Betel era governada por um Profeta que ditava as leis. O Profeta tinha o dom da visão e podia se casar com várias mulheres. Os ensinamentos religiosos deviam ser cumpridos à risca, sob pena de prisão e morte na fogueira. A bruxaria era extremamente combatida e até mesmo a leitura de livros era considerada uma transgressão ao Protocolo Sagrado.


A protagonista Immanuelle é considerada amaldiçoada, tendo em vista ter sido fruto de um relacionamento inter-racial e inapropriado. A cor de sua pele era discriminada. Veja-se trecho em que a personagem se compara com sua amiga Leah:

“Nas Escrituras e nas histórias, nos vitrais das janelas da catedral ou nas pinturas penduradas nas paredes de pedra, os anjos sempre se pareciam com Leah: cabelos dourados e olhos azuis, vestidos com velas sedas e cetins, as faces robustas e a pele tão pálida quanto as pérolas dos rios. 

Já quanto as garotas como Immanuelle – aquelas das Cercanias, com a pele escura e cachos preto-azulados, as maçãs do rosto tão afiadas quanto pedra de cantaria –, bem, as Escrituras nunca as mencionaram. Não havia estátuas ou pinturas retratadas à sua semelhança, nenhum poema ou história escrita em sua honra. Permaneciam sem ser mencionadas e sem ser vistas”. (2021, p. 17).

Nota-se que a autora trouxe para ficção algo comum na realidade. A valorização de determinada aparência física em detrimento de outra. Além do preconceito racial, a comunidade de Betel está afundada em segredos sombrios que envolvem abusos e mortes de mulheres inocentes que foram acusadas injustamente de bruxaria. 
Contrária à cidade sagrada, estava a Mata Sombria – local proibido – pois era assombrado por bruxas perigosas. A protagonista sentia um chamado da Mata Sombria, especialmente em virtude do passado de sua mãe. Após um acidente, Immanuelle acaba adentrando na floresta das bruxas e sua vida muda radicalmente. Sua presença desencadeia a aparição da praga de sangue e ela descobre que ainda aconteceriam mais três pragas: flagelo, trevas e massacre. 

Após a primeira praga aparecer, Immanuelle precisa resolver o mistério envolto em seu nascimento para combater a primeira praga e evitar as demais. Para isso ela conta com um grande aliado: Ezra, um dos filhos do Profeta.

A narrativa traz a dualidade recorrente no gênero gótico: trevas versus luz. Uma protagonista que luta entre esses dois opostos em busca da verdade. A luz talvez esconda trevas e vice-versa.  

Essa história vai encantar muito os leitores que gostam do misterioso mundo das bruxas. Ademais, o livro não cuida apenas da fantasia que invoca a magia, mas também de temas relevantes como: uma mulher heroína para derrotar um sistema religioso corrupto; a religião usada para mascarar ações erradas; injustiças cometidas contra mulheres; e a força das mulheres. 

As vozes das mulheres ecoam nas páginas dessa obra envolvente, tantas que foram maltratadas e mortas sem motivo, apenas em prol do interesse de um governo que se escondia no véu de um falso puritanismo. Leia o livro para desvendar esse fascinante enigma!